Such Pretty Forks in the Road

Such Pretty Forks in the Road

“Tudo que eu sentia está nas músicas”, explica Alanis Morissette ao Apple Music sobre seu novo álbum, Such Pretty Forks in the Road. É uma ideia simples, mas nestes oito anos que separam o novo trabalho do anterior, Havoc and Bright Lights, a cantora canadense sentiu e passou por muitas experiências: múltiplos abortos espontâneos, o nascimento de dois de seus três filhos, depressão pós-parto e a descoberta de que passou quase uma década sendo roubada em milhões de dólares pelo seu empresário. Tudo isso serviu de base para um dos seus discos mais poderosos desde Jagged Little Pill, de 1995. Such Pretty Forks in the Road é um conjunto de baladas profundamente sinceras que Morissette gravou em Malibu e em sua nova casa, em São Francisco, ambos na Califórnia. O título vem da letra de “Smiling”, uma faixa do musical da Broadway inspirado em Jagged Little Pill. “Sempre que acontece algo difícil, que muda minha vida, quero registrar”, diz ela. “Alguns dos momentos mais complicados renderam as maiores evoluções na minha consciência.” Aqui, a cantora nos guia por cada uma das faixas do álbum. Smiling “Escrevi esta para o disco, mas acabou ficando mais apropriada para MJ, a protagonista do musical. Ela deseja servir e se portar bem, sem decepcionar sua família ou sua comunidade. Eu estava perdida quando escrevi ‘Smiling’. Estava perdendo minha relação com Los Angeles, de luto por uma casa que foi minha por cerca de 20 anos. Tivemos os incêndios em Malibu, meu cachorro morreu... Tudo estava acontecendo ao mesmo tempo. Inúmeros terapeutas me falaram: ‘Alanis, você está dizendo algo muito desafiador e difícil de ouvir, mas com um sorriso no rosto. Me fale sobre isso.’ É a ideia de se portar de uma maneira e estar destroçada internamente. Não é algo incomum em certos tipos de pessoas que querem ajudar. Eu talvez tenha visto minha mãe chorar umas três vezes na minha vida e uma delas foi quando toquei essa música para ela. Algo na faixa realmente a tocou. Depois que ela foi embora, analisei a letra porque queria entendê-la. ‘Ok, essa música realmente a atingiu. O que foi que eu escrevi?’ É um bom modo de conhecer seus pais: veja como eles reagem às suas músicas.” Ablaze “Esta me faz chorar quando presto atenção na letra, então preciso ficar pensando em beisebol o tempo todo. Deus me livre, mas se eu morresse, seria isso que gostaria de passar para meus filhos. Tenho todos esses diários e livros que seriam para eles. Sou uma mãe apegada, e obcecada com o desenvolvimento do apego e da exploração, que forma uma noção de identidade e competência. Mas não queria compor uma música inteira sobre essas coisas, então comecei a falar sobre o dualismo e como sempre há outro lado quando estamos na Terra. Existe o calor e o frio, o alto e o baixo. A faixa era um pouco maior, na verdade, e tive de cortar um dos versos.” Reasons I Drink “Meus três grandes vícios são trabalho, amor e comida. Os secundários são todas as outras coisas agradáveis. Acho que a noção geral de vício foi, por muito tempo, estigmatizada e imbuída de vergonha: ‘Tenha vergonha por ser um viciado. Tenha vergonha de precisar ir para uma clínica de reabilitação. Tenha vergonha por sua falta de disciplina’. Isso é uma grande baboseira porque, geralmente, você não vai encontrar pessoas mais disciplinadas que viciados. Ela é sobre ver viciados como nós procurando alívio. Tento trazer alívio a uma cultura que está, basicamente, cronicamente esgotada. Estou dando um desconto para mim e para outras pessoas, além de um pouco de perspectiva. Não é sobre alguém que está apenas tentando causar. É alguém que precisa de apoio e ajuda, e precisa ficar frente a frente com alguém que não lhe julgue para que possa se curar. Byron Katie, certa vez, disse: ‘Drogas e álcool estão apenas fazendo o seu trabalho’.” Diagnosis “Como uma celebridade, uma pessoa pública, acho que não recebo muitos comentários amáveis e gentis. Recebo projeções positivas ou negativas, percepções equivocadas ou incompreensões sobre minha perspectiva. Já fui vista como totalmente sã. Já fui vista como instável, imprevisível e selvagem. Quando eu era criança, meu pai me falou que as pessoas iriam amar ou odiar o que eu fizesse, e outras simplesmente não dariam a mínima. E que isso não mudaria nunca, independentemente do que eu fizesse. Então, que eu deveria continuar fazendo. ‘Diagnosis’ sou eu dizendo: ‘Olha, não me importo. Nem sei como me enxergam hoje em dia, mas é isso que está acontecendo. Tenho depressão pós-parto, não consigo pensar direito.’ Passei a vida toda dependendo da minha função cognitiva, mas quando não pude depender dela durante as atividades pós-parto, pensei: ‘Em que posso confiar? E como estou sendo vista?’ E no meio da composição, houve momentos em que só queria entrar no oceano e não voltar mais. Mas aí pensei nos meus filhos e disse: ‘Isso não vai acontecer’.” Missing the Miracle “Casamento, para mim, significa duas pessoas querendo, teoricamente, participar ativamente na cura das feridas de ambas. Mas com tanta coisa acontecendo, sinto que estamos perdendo o sentido e a beleza de tudo aquilo. E não é tão raro se sentir esgotado pelo dia-a-dia e ser o gatilho dos traumas um do outro. É uma forma de ir perdendo a beleza, até que ela desapareça. Quando passo dez minutos sozinha, consigo voltar a ver como é bonito, como é um milagre que qualquer relacionamento possa ser sustentado mesmo por pessoas tão diferentes e como nós, lindos seres humanos, somos tão complicados. Todos nós temos perspectivas diferentes. Como é que qualquer relação dá certo? Somos animais. Mas acho que, quanto mais consciência trago para o meu casamento, mais eu consigo ver que é uma experiência incrível, mesmo quando é difícil. É uma lembrança para mim mesma, para tirar a cabeça da areia, olhar ao meu redor e ser grata.” Losing the Plot “Los Angeles sempre foi uma cidade incrível de morar quando eu estava trabalhando. Mas quando não estava, sentia que não morava na cidade certa, ainda mais sendo mãe. A frase 'I am lying down my cape' [estou pendurando minha capa] vem do pensamento de que posso ser a super-heroína para todo mundo. Casa, cachorro, comida, viagem, logísticas ou, no nosso caso, educação - estamos fazendo educação em casa há nove anos. É como ser uma supermulher e apenas se render, dizendo: ‘Não posso continuar a fazer as mesmas coisas e pensar que vou obter resultados diferentes’. Deveria tomar todas essas decisões sábias, mas não tinha acesso à minha intuição da mesma forma que tenho normalmente. A depressão pós-parto é um fantasma que assombra e rouba muita coisa. Mas superei isso duas vezes, então sei que há um outro lado e acho que será logo depois que eu parar de amamentar. Te falo depois.” Reckoning “Tenho escrito músicas sobre ter sido abusada sexualmente faz muito tempo. Faixas como ‘Hands Clean’ [de 2002] vieram e passaram. Muitas vezes, o trauma fica armazenado nos nossos corpos e nos dissociamos dele. A luta, a fuga, a paralisia. Mais tarde, podemos desmoronar e enfrentar isso quando sentirmos ser uma opção mais segura. É bem traumático não apenas reviver tudo, mas fazer isso sob o olhar público e ser questionada. Quando ouço ‘Reckoning’, há certas passagens no segundo verso que, quando as ouço, não consigo segurar o choro: ‘Onde está todo mundo? Onde estão todos aqueles protetores ao meu redor?’ Quando me perguntam o que eu falaria para minha versão de 19 anos, a Alanis de 46 anos diria: ‘Temos de conferir e checar as pessoas que estão mais próximas’. Porque muitas pessoas ao meu redor não eram as mais confiáveis e não queriam o meu bem. Amo essa música porque há uma empatia maior por aquela garotinha, e nem tanto pela mulher adulta olhando para trás.” Sandbox Love “Ela levanta uma ótima questão sobre as consequências do abuso sexual: O que seria sexo seguro? E qual prêmio eu deveria buscar? Existe essa cultura do pornô, do mau comportamento e de ter uma amante. Para nós, com um histórico de abuso sexual, tantos reparos são necessários para nos considerarmos experientes em uma relação. Em ‘Sandbox Love’, imagino como seria sexo saudável, como seria esse lugar.” Her “É sobre o ‘Ela’ como eu, como o Feminino Divino, como o feminismo. Tive tantas mentoras, mulheres que realmente representaram o ser maternal. Especialmente no pós-parto, há todo esse pensamento sobre ‘Quem vai ser a mãe da mãe?’ Eu e meu marido estamos sempre brincando que ele recebe toda uma energia maternal de mim, e eu pergunto: ‘Onde está a minha energia maternal? Eu também preciso de colo’. Para mim, essa música é realmente sobre buscar a mãe, a busca pelo maternal, a ternura empática da pele na pele. Além disso, na espiritualidade, amo a busca pela percepção dos fios de continuidade entre todas as religiões, todas tão patriarcais. Acho que sou eu falando: ‘Desculpa, mas não vou rezar para o homem velho no trono dos céus, por mais amável que seja essa fantasia. Farei isso para a feminilidade pela qual tanto anseio.’” Nemesis “Então, há uma teoria de que 20% dos animais e humanos são altamente sensíveis em termos de temperamento. Ao ponto de que eles podem entrar em um recinto e assimilar 500 pedaços de informação, enquanto os outros 80% só assimilam 50 pedaços de informação. Tenho uma queda por sutilezas e acho que é por causa do meu temperamento. Acho que todos estão percebendo agora o quanto são adaptáveis, mas mudanças são difíceis. Nunca fui boa nisso, estou sempre assustada. Mais tarde, percebo como fazer aquela mudança foi uma boa ideia, mas enquanto estou na situação, passo por um sofrimento profundo. Não significa que não faço mudanças diariamente, porque, para que possamos evoluir nossas consciências, temos de estar dispostas a dizer adeus ao antigo. Isso certamente tem a ver com virar mãe, algo que muda sua cabeça totalmente. Mas é muito mais que isso: deixar o Canadá, sair em turnês e dizer adeus aos meus amigos; e voltar para casa e dizer adeus a todo mundo na estrada. Acho que é a natureza da vida. A vida é uma mudança constante. Mas não significa que não brigo contra isso e resisto como uma lutadora profissional.” Pedestal “Lembro que estava namorando alguém e fiz um show para 40 mil pessoas. Fui para o camarim toda suada e exausta. Perguntei para meu namorado: ‘O que achou do show?’ Ele respondeu: ‘Do que você está falando? Você acabou de ouvir 40 mil pessoas gritando seu nome. Qual o seu problema?’ Eu disse: ‘Ah, eu não conheço aquelas pessoas’. É assim quando se cresce sob o olhar do público. É sobre escrever músicas aos 16 anos e querendo evoluir aos 19 anos e ter pessoas querendo me convencer a não fazer isso, sem me enxergar como um ser humano que está evoluindo e se expressando. É sobre olhar para todas aquelas relações passadas, sejam namorados, minha família quando eu era mais jovem, diferentes produtores ou os chamados guardiões que deveriam tomar conta de mim e estavam sendo inapropriados sexualmente. Há muitos relacionamentos que começaram com um pensamento de que poderiam ser seguros ou bem íntimos. Então, eu descobria que havia um bocado de oportunismo envolvido, alguma surpresa ou traição - até fraude, como acontece. Essa música leva isso ao mínimo denominador comum: no fim do dia, ainda sou um ser humano com muitas necessidades, que é vulnerável, assustado e tremendo como um poodle no canto da casa, como qualquer outra pessoa.”

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